Quando recebeu o convite para integrar a equipe criativa do filme A Paixão Segundo G.H., projeto do cineasta Luiz Fernando Carvalho a partir do romance homônimo de Clarice Lispector, Melina Dalboni se viu numa espécie de encruzilhada. Depois de quinze anos atuando como jornalista, ela se deparou com a possibilidade de vivenciar uma experiência vertical como roteirista. Mas, segundo ela própria, recusar fazer parte desta jornada, fruto da aproximação entre a literatura radical de Clarice e o cinema autoral de Carvalho, estava fora de cogitação.
Diário de um filme, que chegou às lojas pela Rocco no inicio do mês, mergulha no processo criativo e na aventura de se fazer cinema independente no Brasil, a partir da realização do longa-metragem protagonizado por Maria Fernanda Candido, que está em cartaz nos cinemas. Escrito em primeira pessoa, ele pode ser lido como um ensaio de caráter pessoal sobre o fazer cinematográfico. Com escrita cativante e reflexões profundas, Diário de um Filme promete transportar os leitores para o fascinante universo da criação cinematográfica através do relato detalhado e de uma visão íntima do trabalho do cineasta e equipe, revelando os desafios, as inspirações e as descobertas por trás da transposição para o cinema de uma das obras mais importantes da literatura brasileira. Um testemunho da história que há por trás do que é projetado na tela.
A autora conduz o leitor a um mergulho no percurso criativo vertical do cineasta e da atriz e se depara com as circunstâncias externas, pessoais ou não, que afetam a filmagem. “O livro é um documento necessário a todos que buscam atravessar seus próprios limites”, comenta Carvalho.
Além do diário da autora, que participou de todas as etapas do longa-metragem, a publicação traz fotos de cena e reproduções de cadernos com anotações do diretor, além da transcrição de palestras de grandes especialistas na obra da escritora, como Nádia Battella Gotlib, biógrafa de Clarice e supervisora de texto do filme, as professoras de literatura Yudith Rosenbaum e Flavia Trocolli, o ensaísta José Miguel Wisnik, o filósofo Franklin Leopoldo e Silva e a psicóloga Rafaela Zorzanelli. Todos participaram das Oficinas Teóricas realizadas durante a preparação para o filme.
O resultado é um painel que atravessa as questões subjetivas e técnicas do filme, as inspirações, a vulnerabilidade de uma criação, o diálogo entre a literatura de Clarice e o cinema de Carvalho, o extraordinário tour de force de Maria Fernanda Candido e a busca incansável pela própria linguagem cinematográfica. “Não registrei apenas os dados técnicos e as questões artísticas, mas, principalmente, os estados emocionais de um grupo de artistas que se entregava à solidão da criação”, explica Melina. Diário de um filme é leitura obrigatória para admiradores de Clarice e do cinema brasileiro e para os interessados na adaptação de obras literárias para as telas.
“O processo foi tão profundo e tão emocionante, a vivencia foi tão intensa que eu decidi também transformar em um livro. Então é um livro que virou um filme que agora virou um livro. E nesse livro eu conto todo o nosso trajeto do percurso criativo, mas não só isso. Eu acho que para fazer um filme tem todo um grupo de artistas e técnicos que botam ali toda sua vivência, suas memórias, suas dores, seus sonhos, seus medos, suas angústias, suas dúvidas e sua coragem de fazer uma obra como é o filme (A Paixão Segundo G.H.), conclui a escritora.
Melinda Dalboni é escritora, roteirista e jornalista. Foi colaboradora da série IndependênciaS (TV Cultura, 2022) e roteirista dos filmes A paixão segundo G.H. (2023) e Tire 5 cartas (2023). É autora dos textos de Meu pedacinho de chão (Editora Casa da Palavra, 2014) e de Sonia em fotobiografia (Edições Sesc e Cepe, 2023), sobre Sonia Braga, e organizadora de Fotografias – o processo criativo dos atores de Dois Irmãos (Editora Bazar do Tempo, 2017). Atualmente, escreve para os principais veículos de imprensa do Brasil.
Nenhuma matéria relacionada.