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Joana da Paz, a mulher que inspirou o filme Vitória

Vitória apresenta a atriz Fernanda Montenegro no papel de Joana da Paz, uma figura essencial na luta contra o crime no Rio de Janeiro. Ela foi protagonista de um dos episódios mais marcantes do jornalismo brasileiro. De Quebrangulo, no Agreste alagoano, para a Zona Sul do Rio de Janeiro, a trajetória de Joana Zeferino da Paz ganhou as telonas esta semana. Da janela de sua casa, Joana registrou a rotina do tráfico em uma favela de Copacabana. Com as gravações, que resultaram na prisão de mais de 30 pessoas, ela precisou entrar para o programa de proteção à testemunha até o momento de sua morte.

Inconformada com o crescimento da violência na região, a idosa passou a filmar traficantes, policiais corruptos e confrontos armados usando uma câmera caseira. Com provas suficientes reunidas, procurou a delegacia para denunciar os crimes, mas sem obter sucesso inicialmente. No entanto, sua persistência chamou a atenção do policial Aurílio Nascimento, que a colocou em contato com o repórter Fábio Gusmão.

JOANA DA PAZ, VITÓRIA

UM ATO DE CORAGEM

Em uma reportagem publicada no Extra, Fábio Gusmão explica por que Dona Joana decidiu denunciar os criminosos. Ela relatou à 12ª DP (Copacabana) que os bandidos a ameaçaram diversas vezes, mandando que ela saísse da janela. No dia 20 de março de 1999, de acordo com ela, eles dispararam contra sua janela. Já no dia 20 de novembro, um policial escreveu um relatório afirmando que foi diversas vezes ao apartamento de Dona Joana, mas nunca a encontrou em casa. Ela havia permitido que a polícia usasse o imóvel para fazer a investigação.

Quando a chamaram de mentirosa, Dona Joana resolveu provar a verdade. Em 2003, ela entrou com um processo na Justiça contra o Estado, pedindo indenização por danos morais e materiais. Ela se revoltou ao ouvir o então comandante do 19º BPM (Copacabana) dizer que ela estava mentindo e que a PM combatia o crime na Ladeira dos Tabajaras. Ele a desafiou a provar as acusações que fazia contra a polícia, como conta o jornalista.

Após retornar da Defensoria Pública, Dona Joana decidiu comprovar a veracidade de suas afirmações. Para isso, comprou uma câmera de filmagens. A nota fiscal original da máquina revela o valor de R$ 2.116, pagos com uma entrada de R$ 800 e o restante de R$ 1.316, dividido em 12 vezes.

Em entrevista do THN1, Gusmão conta que a coragem de filmar e entregar todo o material à polícia, Joana da Paz puxou da própria mãe, que denunciou às autoridades alagoanas o coronel que abusou de Joana, ainda uma adolescente, que acabou engravidando.

“É importante lembrar que Dona Joana teve uma vida muito marcada pela violência. Ela, nascida em Alagoas, na cidade de Quebrangulo, relatou o caminho ali de sofrimento que ela viveu, a violência que sofreu de um coronel da região. A gravidez que veio por conta desse ato, a retirada dela do lar, para que as pessoas não soubessem o que ele tinha feito, e ela começou a peregrinar, ainda muito menina, por cidades não só de Alagoas, como também de Pernambuco. Então, isso forjou essa mulher guerreira, lutadora”, conta Gusmão.

“Ao retornar para casa, ainda grávida, perto de ter o seu filho, depois de ter passado por todas as dificuldades e adversidades, ela relata para a mãe o que aconteceu com ela, conta toda a verdade, e a mãe, Dona Rosa, decide denunciar isso às autoridades locais, independente de quem era a figura [um coronel]. Ou seja, ela ali já tinha um grande referencial de força, de coragem”.

Após meses de espera, as investigações de Joana foram finalmente validadas, resultando na prisão de cerca de 30 pessoas, incluindo policiais militares. Como as gravações revelavam facilmente o local onde morava, sua inclusão no Programa de Proteção à Testemunha tornou-se indispensável.

Seguindo a sugestão do jornalista, ela adotou o nome “Vitória”, que posteriormente batizou o filme sobre sua trajetória. Desde então, viveu sob identidade protegida, mudando-se repetidamente de cidade para garantir sua segurança.

O RECONHECIMENTO PÚBLICO

Em dezembro de 2005, sem que seu verdadeiro nome fosse divulgado, Joana recebeu o reconhecimento por sua coragem ao se tornar uma das vencedoras da 14ª edição do Prêmio PNBE (Pensamento Nacional das Bases Empresariais) de Cidadania, uma das mais prestigiadas premiações de responsabilidade social do país. Meses depois, o jornal O Globo a elegeu como Personalidade do Ano do Rio de Janeiro.

Joana Zeferino da Paz, a verdadeira Dona Vitória, faleceu em 22 de fevereiro de 2023, aos 97 anos, após sofrer um acidente vascular cerebral (AVC). Sua morte ocorreu após mais de 17 anos vivendo com uma nova identidade. Somente em 2023, após seu falecimento, sua identidade real foi revelada, momento em que o filme inspirado em sua história já estava em produção. Seu legado ganhou projeção na mídia nacional e internacional, consolidando-a como um símbolo global de resistência, coragem e cidadania.

Joana da Paz e Fábio Gusmão, vitória
Joana da Paz e Fábio Gusmão

“Na tarde da Quarta-Feira de Cinzas, 22 de fevereiro de 2023, às 17h42, no Hospital Geral do Estado, na cidade de Salvador (BA), morreu Dona Vitória, após dez dias de internação, resultado de um acidente vascular cerebral. Nesse mesmo dia e local, nasceu publicamente a alagoana Joana Zeferino da Paz, aos 97 anos, que agora tem a sua identidade revelada após quase 17 anos […] Forjada em coragem, Joana da Paz (como é bom escrever sem medo…) se irritava por ser obrigada a viver escondida. Queria o merecido crédito de quem abdicou de uma vida construída com muito esforço, enfrentando a violência desde criança — Fábio Gusmão

Finalmente, em agosto de 2024, já sob seu nome verdadeiro, Joana recebeu postumamente o Prêmio Construtor da Paz da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), oficializando o reconhecimento de sua inestimável contribuição à sociedade.

Você pode conferir nossa crítica de Vitória AQUI.

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