Filme estreia nos cinemas em 15 de agosto
O filme Revoada, dirigido por José Umberto Dias, acompanha um grupo de cangaceiros em sua busca por vingança após a morte de Lampião. Mostrando a luta incessante e desesperada dos cangaceiros, o filme funciona como um ponto final na história do cangaço brasileiro.
A forma como a narrativa é apresentada e a história é editada aproxima muito o longa aos filmes produzidos durante a época do Cinema Novo brasileiro. Em especial ao clássico Deus e o Diabo na Terra do Sol.
Revoada x Deus e o Diabo na Terra do Sol
Em 1964, Glauber Rocha lança o filme que pode ser considerado um dos pioneiros do Cinema Novo, um estilo que abominava o modo hollywoodiano de fazer cinema. Ele tinha como principal viés mostrar um Brasil desconhecido, com muitos conflitos políticos e sociais, e tendo o Nordeste como palco. O Cinema Novo se apresenta como uma mistura do Neorrealismo (por seus temas e forma de produção) e da Nouvelle Vague (por suas rupturas de linguagem).
Glauber Rocha define que “uma câmara na mão e uma ideia na cabeça” é como deve-se fazer este tipo de cinema; e também o seu objetivo: a construção de uma “estética da fome”. É exatamente nestes elementos que o longa de José Umberto Dias se assemelha tanto ao produzido no Brasil entre as décadas de 1960 e 1970.
José Umberto Dias mostra a seca, a sujeira e a violência do cangaço em 1938. Ele coloca o interior do Brasil como palco e personagem principal. Ele usa de transições e cortes rápidos para causar o desconforto no espectador. A mise-en-scène oscila entre momentos de acúmulo de tensão e explosões de violência.
“O filme Revoada assume esse enfoque cujo núcleo é o jovem de uma região sob vários aspectos inóspita, desejoso de viver, de ter sob seu controle a seiva da vida e que opta pela rebelião existencial, por um estilo de liberdade a todo custo”, afirma o diretor.
Outro ponto que pode ser considerado semelhante entre Revoada e Deus e o Diabo na Terra do Sol é a música. Ambos utilizam a trilha trovejante e intensa para destacar momentos de tensão. A forma como a narrativa se apresenta, em sua mais pura homenagem ao nordeste, é quase como uma literatura de cordel em certos pontos. É como se o personagem da cena estivesse recitando sua prosa; no entanto, sua fala é parte de um diálogo.
Ao encaminhar-se para o final do filme, estamos chegando ao fim do cangaço. Os personagens principais da história, Lua Nova e sua companheira Jurema, estão deixando suas armas para trás. Isto é uma representação simbólica do fim do cangaço, acentuada pela cena final, o trágico fim do casal. E, ao cair morto na água, Lua Nova também vira uma representação de que “o sertão vai virar mar e o mar vai virar sertão”. Tal qual profetizado por Sebastião, o ‘Deus Negro’, em Deus e o Diabo na Terra do Sol.
O cangaceiro
A figura do cangaceiro é, na opinião do diretor do longa, para o cinema brasileiro, o mesmo que o cowboy é para o cinema hollywoodiano e o samurai para o cinema japonês.
O diretor considera que “a diversidade cultural inspira a singularidade de cada povo, a nos fazer constatar o quanto, ao longo do tempo, podemos ver perfilada toda uma linhagem de guerreiros universais que compõem o arquétipo do bandoleirismo de vendeta a atravessar o imaginário oblíquo da humanidade”. Mas é certo o quanto, enfatiza o cineasta, “o fenômeno do bandido primitivo ganhou todo um corolário próprio na zona rural do Nordeste do Brasil”.
Revoada
Revoada é um filme para quem quer se conectar com um dos principais períodos do cinema brasileiro, com o Nordeste e com as múltiplas maneiras de se fazer a sétima arte.
Você pode conferir o trailer clicando aqui ou abrindo diretamente no vídeo abaixo.
O projeto de distribuição de “Revoada” foi contemplado nos Editais da Paulo Gustavo Bahia e tem apoio financeiro do Governo do Estado da Bahia, através da Secretaria de Cultura, via Lei Paulo Gustavo, direcionada pelo Ministério da Cultura e Governo Federal. A produção do filme teve apoio financeiro do Fundo de Cultura da Bahia.
Revoada, longa de José Umberto Dias, entra em cartaz no dia 15 de agosto de 2024 em todo o Brasil. O elenco traz Jackson Costa, Annalu Tavares, Nelito Reis e Aldri Anunciação. O filme recebeu os troféus Cacto de Ouro nas categorias melhor atriz (Annalu), figurino (Zuarte Júnior) e maquiagem (Wilson D’Argolo) no 10º Encontro Nacional de Cinema e Vídeo dos Sertões em Floriano (PI).
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Uma resposta
“Revoada”, de José Umberto, não tem nada a ver com “Deus e o Diabo na Terra do Sol”, de Glauber Rocha
Tomemos a sinopse de “Deus e o Diabo na Terra do Sol”, obra que amplia a crítica social de Glauber Rocha em relação à exploração de sertanejos e à pobreza no sertão nordestino:
“Manuel é um vaqueiro que se revolta contra a exploração imposta pelo coronel Moraes e acaba matando-o em uma briga.
Ele passa a ser perseguido por jagunços e foge com sua esposa Rosa, juntando-se aos seguidores do beato Sebastião, que promete o fim de qualquer sofrimento. Porém ao presenciar a morte de uma criança, Rosa mata o beato.
Enquanto isso, Antônio das Mortes, um matador de aluguel que presta serviço à Igreja Católica e aos latifundiários da região, extermina os seguidores do beato”.
Já a sinopse de “Revoada” mostra :um grupo de cangaceiros, composto por duas mulheres e oito homens, que sente a informação da morte de Lampião.
Os cangaceiros ficam desnorteados e não sabem como agir e nem como lidar com a situação e passam a viver o impasse entre se entregar ou buscar vingança. A polícia e a angústia os persegue pelo interior do nordeste.
Na saga construída por José Umberto, e de “parabelo na mão”, o grupo se mantém unido, mesmo envolto em desafios internos, mas demonstrando o espírito vivo da resistência, na busca por vingar o líder morto e em meio ao desespero da fuga.
O amor e o ódio calçam a mesma alpercata de couro. Uma volante os persegue e parece estar sempre próxima. No encalço.
Logo – é fácil constatar – “Revoada”, de José Umberto – com pré-estreia hoje em São Paulo e estreia nacional dia 15 – não tem nada a ver com o filme de Glauber, exceto o cangaço, que não é bem o tema de Glauber, senão de modo indireto, subjetivo, como entendo.