O cinema de terror sul-coreano já provou ser ousado, perturbador e repleto de camadas sociais. Ruídos, estreia de Kim Soo-jin na direção, confirma isso ao transformar algo cotidiano, o barulho dos vizinhos, em uma experiência aterrorizante. A produção fez sua estreia na América do Norte durante o Fantasia Festival e já chega chamando atenção pelo seu conceito ousado: um horror em que os sons tomam o lugar dos sustos visuais.
Mas será que o resultado compensa? A resposta é tanto “sim” quanto “quase lá”.
O barulho que enlouquece
A trama acompanha Ju-hee (Han Soo-a), uma jovem que tenta desesperadamente abafar os ruídos que parecem vir de todo lado em seu prédio. Ela instala placas acústicas, implora para os vizinhos diminuírem o volume, mas nada parece funcionar. Sua paranoia culmina em um desaparecimento misterioso, em plena luz do dia.
Quem retorna para resolver o mistério é sua irmã, Ju-young (Lee Sun-bin), que além de lidar com a perda, enfrenta uma vulnerabilidade própria: a deficiência auditiva. Conforme investiga o sumiço da irmã, ela descobre que não são apenas os barulhos que estão contra ela, mas também vizinhos hostis, segredos enterrados e, talvez, algo sobrenatural à espreita.
O som como ferramenta de terror
O grande trunfo de Ruídos está na sonoplastia. Rangidos, vozes distantes, unhas arranhando superfícies e estalos secos criam uma atmosfera que ataca diretamente os nervos do espectador. O design de som é tão intenso que torna quase impossível não compartilhar da ansiedade crescente de Ju-young.
Essa escolha criativa é o que diferencia Ruídos de outros filmes de “apartamentos assombrados” e dá ao longa uma identidade própria. Quando o filme se apoia nessa proposta, o terror auditivo, ele acerta em cheio.
Entre o horror sobrenatural e o drama social
Assim como outros títulos do cinema sul-coreano, Ruídos também se ancora em uma crítica social. O cenário da crise habitacional da Coreia do Sul permeia a trama, evidenciando como espaços superlotados e vizinhos em atrito se tornam um campo fértil para o horror.
Kim Soo-jin sabe equilibrar os dois lados, o sobrenatural e o humano, em boa parte do tempo. As disputas entre moradores, o desprezo da associação de apartamentos e as dificuldades de convivência adicionam camadas realistas à narrativa.
Onde o filme tropeça
Apesar da premissa brilhante, Ruídos sofre no terceiro ato. A quantidade de personagens e subtramas cresce demais, tornando a reta final confusa e esticada além da conta. O clímax, embora barulhento e caótico, perde força por não conseguir amarrar todos os elementos apresentados.
Esse excesso acaba diluindo parte da tensão construída e deixa a sensação de que havia mais potencial do que resultado.
Vale a pena assistir Ruídos?
Definitivamente! Mesmo com tropeços, Ruídos se mantém como um filme instigante, criativo e promissor, principalmente por ser a estreia de Kim Soo-jin. A diretora mostra confiança na construção de suspense e entrega momentos verdadeiramente perturbadores.
Ruídos não é perfeito, mas confirma a força do cinema de horror sul-coreano em reinventar fórmulas. Com uma proposta única e execução ousada, transforma som em instrumento de medo e paranoia. E embora o desfecho não esteja à altura da expectativa, é impossível sair ileso da experiência.
O filme estreia em 9 de outubro nos cinemas nacionais.