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Senua olhando pra frente na thumb

Hellblade: Senua’s Sacrifice, a psicose mitológica

Amanhã, 20/05 será lançado Senua’s Saga: Hellblade 2. Para se preparar e saber o que esperar, leia a crítica a seguir do primeiro jogo Hellblade: Senua’s Sacrifice. A partir da crítica, o jogador poderá ter uma noção do que esperar, além de ficar por dentro do que ocorreu no primeiro jogo da franquia.

Hellblade: Senua’s Sacrifice, um dos jogos mais premiados da Ninja Theory, estúdio de desenvolvimento de jogos britânico sitiado em Cambridge. Em uma obra extremamente introspectiva os desenvolvedores abordam a psicose em um cenário mitológico, apresentando Senua e sua jornada para salvar seu amado.

A obra propõe um jogo de aventura em terceira pessoa como Senua sendo a protagonista. O jogo se apresenta em modo campanha, onde o jogador deverá seguir a jornada até o objetivo final que é resgatar Dillion. Além do elemento de batalha que é composto por um combate action com mecânicas de desviar, bloquear, ataque leve e pesado, há também os puzzles que em diversos momentos funcionam como elemento de progressão além de se apresentar como mecânicas diferentes que dão variabilidade a obra.

A história de Senua se baseia na perspectiva do povo Celta. Os próprios desenvolvedores falam sobre a inspiração em Senua como uma habitante da Escócia que no período do jogo era habitado pelos celtas. Os inimigos invadem a vila de Senua e matam todos, inclusive seu amado Dillion. Estes inimigos invasores são os “homens do norte”, os vikings para ser mais preciso – historicamente o povo celta foi invadido pelos vikings e sofreu diversas perdas nas mãos destes terríveis adversários -. Após a morte de seu amado, Senua avança para a terra dos homens do norte a fim de trazer seu homem de volta a vida, ela adentra a mitologia do inimigo e se encaminha até Hel, o inferno nórdico, atrás da alma Dillion.

Desde o primeiro momento fica claro um aspecto da personagem, a psicose. No documentário disponibilizado no menu do jogo, os desenvolvedores falam sobre essa perspectiva e o porquê de adicioná-la no jogo. As pessoas geralmente sofrem psicose a partir de algum estigma, este estigma pode estar relacionado a alguns acontecimento na infância, como o mau trato dos pais ou coisa parecida, ou no caso celta, geralmente este estava ligado às pessoas presenciarem os horrores da guerra. O caso de Senua é relacionado ao primeiro exemplo de estigma, sua relação com o pai e o suicídio da mãe causam esta condição a garota. As pessoas que sofrem deste distúrbio eram conhecidas como Geilt, geralmente eles eram enviados para viver nas florestas, isolados, longe da vila, e obviamente na época isto não era visto como um distúrbio mas sim como uma maldição. A condição da garota é agravada com a morte de seu amado e a culpa auto imposta por não estar presente no momento para tentar salvá-lo. Após estes acontecimentos que a jornada de Senua se inicia.

Um elemento interessante é a relação da psicose com a mitologia. A garota a todo momento está ouvindo vozes sussurrando em seus ouvidos, ao mesmo tempo que precisa enfrentar os diversos embates até chegar a Hela, a deusa do submundo e rainha de Hel. Diversos acontecimentos são vivenciados e um grupo de significação passa-se por todos estes, sejam as batalhas contra deuses, os diferentes puzzles e as conversas com os personagens que se fazem presente na mente da garota. Porém, sempre uma dúvida percorre a mente do jogador, será que isso é real?. A realidade fantasiosa que ocorre pode ser corroborada pela mitologia proposta porém o elemento da psicose faz a barreira da realidade ficar turva. Será mesmo que tudo que está acontecendo com Senua é real, ou é mundo criado em sua mente?. A resposta para estes questionamentos é dada pelos desenvolvedores no documentário, “se Senua observa as coisas daquele modo, para ela é real”. Esta afirmação é incrível, pois o jogador ao controlar Senua precisa assumir sua psicose como parte integrante de sua experiência, logo, as vozes, cenários e acontecimentos são reais para aquele que sente.

Como dito na introdução, a obra é bem intimista. O único ser humano presente na obra é Senua, os outros personagens ou são entidades ou lembranças. Há somente ela e a realidade mística ao seu redor. Este ambiente abre espaço para explorar dedicadamente cada parte da personagem. É possível entender todas as fraquezas, anseios, medos e situações que assolam a mente de Senua, sejam elas referentes ao passado ou presente. Há tempo para explorar a personagem e desenvolvê-la nos mínimos detalhes, e isto é feito. Outro elemento que auxilia nesta intimidade com a personagem é o trabalho com as câmeras, não é raro o jogador sentir que a Senua está falando com ele, o foco no rosto da garota é recorrente e revela diversos aspectos que poderiam ser relegados, mas não são, pois estes reforçam ainda mais o aspecto psicótico da personagem. 

Ao final da obra, diversos elementos em relação a personagem são debatidos: a significação da escuridão que a corrompe, seus objetivos e o pertencimento da culpa de diversas situações vivenciadas. Neste momento ocorre uma aceitação de certas situações, há episódios superados pela protagonista que finda com a superação do passado que a acorrentava. Agora, pelo menos uma das amarras foi solta, uma parte do passado foi deixado para trás para dar espaço para o novo, para uma nova aventura. A sensação deixada é que talvez o jogador fosse somente mais uma das vozes que impregnava a consciência de Senua. No momento da superação do passado uma das vozes é abandonada, essa voz é a narradora dos sentimentos da garota durante toda a obra. Já o jogador, este é uma das vozes que continuará a acompanhar Senua em sua próxima jornada.

Em relação a jogabilidade, Hellblade: Senua’s Sacrifice apresenta além do combate action um elemento interessante de puzzle. Os puzzles possuem um modelo que varia dentro da obra. Em um primeiro momento há a necessidade de encontrar as diferentes runas presentes no ambiente – este elemento também reforça a psicose, já que um dos atributos do distúrbio é ver conexões de objetos com algo a mais do que eles realmente são -. Uma variação desta base são os puzzles referente a Sutur e Valravn, onde a temática do gigante de fogo e o gigante da enganação prevalecem e dão características únicas aos seus puzzles. Ainda há os puzzles referentes ao desafio de Odin que realmente destoam do resto, pois saem da mecânica de runas e abordam a personagem a nível pessoal.

Uma crítica que precisa ser feita é a “falsa mecânica” implantada pelos desenvolvedores. Logo após o primeiro combate da obra, há uma apresentação de uma mecânica de “caso o jogador morra demais, seu progresso será perdido e ele terá que recomeçar”. Este aviso altera completamente a relação do jogador com a obra, passa do desfrutar e se desafiar moderadamente em jogo de modo campanha para algo de extremo cuidado, algo mais voltado para um roguelike. A pior parte não é a abordagem, mas a mentira que é essa abordagem. Um site especializado fez um teste no jogo morrendo mais de 50 vezes e o jogo não foi resetado, logo a mecânica é falsa. Os desenvolvedores se pronunciaram quanto a ela dizendo que é algo pensado para aumentar a imersão. Porém, definitivamente não é algo que funciona em um jogo de modo campanha, é ruim, seja a mecânica, seja a forma de implementação.

Concluindo, Hellblade: Senua’s Sacrifice é definitivamente a obra mais incrível que se propõe a reproduzir a psicose. Os jogos proporcionam interação entre consumidor e obra como nenhuma outra mídia o faz. Ao explorar a psicose neste ambiente o resultado foi incrível. Para chegar neste nível de excelência a Ninja Theory consultou com especialistas da área além de pacientes que possuem o distúrbio. Ainda é necessário elogiar a dedicação e empenho para criar algo no nível do que foi apresentado. O melhor é que a obra não se resume a isto, há a presença de um enredo com uma personagem incrível e muito bem desenvolvida, o jogador facilmente se envolve com ela e a história, e acaba por adentrar o mundo a partir da realidade de Senua. Todo o processo de introspecção borra a barreira entre um discurso filosófico e a paranoia, algo surpreendente de se ver em prática. Definitivamente a obra precisa ser colocada em qualquer lista de “Must Play” de qualquer crítico de jogos.

Hellblade: Senua’s Sacrifice é desenvolvido pela Ninja Theory, para saber onde está disponível o jogo ou comprar produtos da obra basta acessar o site deles clicando aqui. Para ficar por dentro de notícias do mundo dos jogos fique atento à BlackCompany em Games.

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