O luto é uma arte, não uma ciência. De acordo com a psiquiatra Elisabeth Kübler-Ross, o percurso do luto envolve sentimentos como negação, raiva, negociação, depressão e aceitação de forma não linear, em que cada indivíduo os processa de forma única.
Na exposição “Sobre Perecer”, que fica em cartaz de 19 a 27 de março, em Curitiba, a artista Mônica Hirano aborda um pouco mais sobre esses sentimentos, explorando também a libertação, a culpa e a contemplação, buscando abrir um debate sobre a importância da comunicação aberta e do apoio emocional coletivo em frente à morte e o luto. A mostra é gratuita e ocupa a PF 2119, localizada na R. Brigadeiro Franco, 2119/2137, um espaço que fomenta a criatividade artística na cidade.
Hirano, que nasceu em Santa Catarina e passou sua mais recente década expondo seus trabalhos pelo Egito, Índia, Malásia, Itália, França e Alemanha, tem mestrado em Gestão de Artes pelo Instituto Europeo di Design, em Roma, e estreia sua primeira mostra individual em Curitiba, trazendo obras que refletem sua pesquisa sobre a finitude da vida, direcionando o seu olhar para o tema de uma forma sutil e cuidadosa, desvendando as ordens sentimentais que a morte pode ocasionar em um ser humano, que, por natureza, constantemente busca sentido a tudo que lhe circunda.
O tema da exposição sempre foi um dos pontos centrais de questionamento na vida de Mônica, que sempre observou a transição da vida para a morte com curiosidade. O que acontece quando deixamos este plano?
A pesquisa do tema se manifestou em suas obras após duas perdas traumáticas, a de sua avó paterna e seu pai, que despertou uma narrativa além de questionamentos. Seus sentimentos de dor, medo e angústia passaram a se apresentar com uma roupagem particular, escancarada e dilacerante. A materialização do sofrimento em arte foi instintiva, racionalizando e canalizando a imensa variedade de sentimentos que assombravam a artista, de maneira involuntária, desalinhada e com diversas graduações de intensidade.
Diferente da abordagem sensacionalista nos noticiários televisivos e programas policiais, em que ocorre a banalização de mortes e tragédias, “Sobre Parecer” é justamente o contrário.
“O antídoto para o medo é começar a falar sobre o assunto desde cedo. Dizer adeus é muito mais fácil quando o luto é coletivo, pois quando vivido em silêncio pode gerar vergonha e culpa”, comenta Mônica Hirano.
80% das obras de “Sobre Perecer” são inéditas. Uma delas é intitulada “Solace is a Weeping River” (O consolo é um rio que chora), um vídeo arte ensaio, produzido na Bélgica, resultado de um compartilhamento coletivo de pensamentos que celebram a vida de quem parte e lamentam e refletem a existência póstuma de quem permanece vivo.
“Vivemos em uma sociedade em que a cultura da negação da morte, em seu sentido mais íntimo, prevalece. Nossa sociedade tem uma cultura centrada na juventude, que glorifica a jovialidade e resiste ao envelhecimento. Consequentemente, as discussões sobre a morte e o envelhecimento são frequentemente descartadas em favor da celebração da juventude e da vitalidade. Não somos educados sobre o assunto e isso se transforma no estigma mais hipócrita que existe, porque absolutamente toda a população mundial convive com esta máxima diariamente”, completa a artista.
Hirano é artista visual, performer e curadora independente. Em suas obras, Mônica utiliza a linguagem da performance, instalação e vídeo, com pesquisa de memória e enfrentamento de sentimentos. Seus estudos recentes envolvem as várias facetas do luto e a certeza iminente da própria morte, explorando de forma sutil e respeitosa esses temas complexos e sensíveis.
“Minha morte estava encomendada para os meus 12 anos, caso eu tivesse a sorte de alcançar esta idade. Os melhores médicos do Brasil não conseguiam diagnosticar qual era a o grau da minha doença pulmonar, e meu caso chegou a ser estudado por especialistas nos EUA. Nenhum desses profissionais conseguia visualizar uma existência que excedesse os 12 anos de idade. Para uma mãe de 30 anos com uma filha única, esses palpites eram completamente aterrorizantes”, explica Mônica. “Eu não fazia ideia do que isto poderia significar, porque do alto dos meus 5 anos, eu não havia presenciado o medo da morte, mas sabia que seus sintomas eram unhas roídas, crises de compulsão alimentar, noites não dormidas, choro, medo e decepção. Eu via constantemente o sofrimento no olhar da minha mãe”, completa.
Em suas obras anteriores, Mônica aborda temas como memórias da infância, raízes de autoestima e a imigração.
Já em relação à prática curatorial, Hirano pesquisa sobre diversidade e o movimento LGBTQAIPN+, inclusão e direitos humanos, e vidas com HIV. Atualmente, segue envolvida com a Inteligência Artificial e os impactos da coleta e distribuição de dados na sociedade.
A estreia da exposição “Sobre Perecer” é no dia 19 de março, das 18h às 22h, na PF 2119, localizada na R. Brigadeiro Franco, 2119/2137. O horário de visitação é de terça-feira a sábado, das 16h às 20h, ou com hora marcada, que pode ser agendada pelo monicahirano@gmail.com. A finissage é no dia 27 de março e a visitação é das 18h às 20h.
Antes da estreia da mostra, Mônica Hirano estará em Curitiba para uma apresentação artística no dia 8 de março, a partir das 18h, no 45o Simpósio Internacional de Performance de Arte, que ocupa o PF2119, uma iniciativa da p.ARTE, uma plataforma independente de performance arte com sede na cidade que recebe artistas de vários lugares do mundo para apresentações especiais.
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