Às vezes o que a gente mais precisa é ler uma boa fantasia. Porque, convenhamos: o mundo real é cansativo. A gente paga boleto, pega trânsito, enfrenta reunião que podia ser e-mail e aí, quando a cabeça já está fervendo, entra num livro com fadas, bruxas e florestas encantadas e lembra que existe beleza nas coisas impossíveis.
Foi exatamente isso que aconteceu comigo essa semana. Eu li A Guardiã do Livro das Sombras, do autor Claus Bugmann, o mesmo de Departamento Nacional de Ocorrências Sobrenaturais, que, aliás, foi um dos finalistas como Melhor Antologia Digital no Prêmio Ecos da Literatura 2024.
O livro foi publicado pelo selo Voe, da Editora Flyve (sim, a mesma por onde publiquei meu livro também), e foi uma daquelas leituras que te lembram por que a fantasia continua sendo um dos gêneros mais encantadores da literatura nacional.
E, olha, você sabia?
O termo “fantasia” como gênero literário só se consolidou no século XIX, mas o primeiro registro de uma história de fantasia vem lá da Epopeia de Gilgamesh, cerca de 2100 a.C. Ou seja: contar histórias sobre o impossível é quase tão antigo quanto a humanidade e a gente continua precisando delas.
Entre o real e o encantado
A Guardiã do Livro das Sombras começa de um jeito bem pé no chão. Ammy é uma jovem comum, dessas que a gente poderia encontrar na fila do café: estuda, trabalha, tem um namorado e está se ajustando à vida em uma nova cidade. Tudo segue dentro do normal até que um encontro inesperado em uma praça muda tudo.
Depois desse encontro, Ammy começa a ser atormentada por aparições que só ela vê. O namorado, Joshua, acredita que seja um problema psicológico e a convence a procurar ajuda com o Dr. Liversen, seu professor. Mas conforme as sessões avançam, as fronteiras entre o que é real e o que é delírio começam a se desfazer.
É aí que a fantasia se revela. De forma lenta, quase sutil, o livro nos arrasta para um universo mágico habitado por fadas, bruxas, trolls e tudo o mais que puderem imaginar. Povos que coexistem com o nosso mundo, escondidos entre florestas e sombras, carregando suas próprias crenças e conflitos.
Bugmann faz algo que eu sempre aprecio na fantasia: usa o fantástico como espelho da realidade. A busca pelo poder, a intolerância e o medo do diferente aparecem aqui travestidos de feitiços e guerras mágicas, mas são temas bem humanos. Para completar, há um protagonismo feminino fortíssimo. Ammy é uma heroína que começa perdida, confusa, questionando a própria sanidade, e termina dona de uma identidade que ela nem imaginava carregar: uma Guardiã.
A narrativa é em primeira pessoa, e isso cria uma tensão sensacional. Passamos boa parte do livro sem saber se o que Ammy vê é real ou fruto da sua mente. Esse jogo psicológico é o que dá força à história! Você começa achando que está lendo um drama contemporâneo, e quando percebe, está no meio de uma guerra entre reinos mágicos.
A escrita do autor é fluida, rica em detalhes e visualmente muito forte. As descrições dos cenários são tão vívidas que dá pra sentir o cheiro da floresta e o final… bom, o final é daquelas reviravoltas que fazem você olhar pro teto uns minutos antes de fechar o livro.
Por que você deveria ler
Se você é fã de fantasia, vai se sentir em casa aqui. E se não é, talvez esse seja um ótimo ponto de partida. A Guardiã do Livro das Sombras tem tudo o que faz o gênero funcionar: mitologia bem construída, conflitos reais, uma protagonista cativante e uma escrita envolvente que te puxa pra dentro do enredo sem esforço.
Mais do que uma aventura mágica, é uma história sobre autodescoberta, fé e coragem, sobre entender quem você é quando tudo ao redor começa a desmoronar. Claus Bugmann entrega uma fantasia nacional de primeira linha e prova que a fantasia brasileira tem tanto poder quanto qualquer título estrangeiro.