Sabe aquele fim de semana preguiçoso no final de novembro, quando tudo o que você quer é escapar um pouquinho da realidade antes de dezembro te atropelar? Pois bem, foi exatamente assim que eu caí nas mãos da DarkSide Books mais uma vez. A editora tem esse talento de lançar edições tão bonitas que eu vou fechando meu carrinho sem lembrar como fui parar lá e Minha Adorável Esposa não é exceção: aquele tipo de livro que te olha como quem diz “vem, prometo que vai ser divertido”.
Eu já estava há algum tempo querendo algo que misturasse aquele clima de “família perfeita de comercial de margarina” com uma boa e velha dose de desgraçamento psicológico. E olha… se existe um romance capaz de provar que vizinhanças impecáveis escondem mais segredos que um sótão proibido da avó, é esse aqui. Não tem como não ser fisgada logo no começo e não apenas pelo verniz impecável da edição, mas pela sensação deliciosa de estar caminhando rumo a uma história doméstica que claramente vai dar muito errado.
E deu. Maravilhosamente errado.
Uma família tão normal que só poderia estar escondendo algo
A narrativa nos leva pela rotina absolutamente crível da família: escolas, trabalho, regras das crianças, frustrações pequenas e metas de vida perfeitamente alinhadas com o catálogo de uma vida suburbana de classe média alta.
É quase irritante o quanto tudo parece normal e é exatamente essa normalidade que torna tudo tão perturbador. O marido, nosso narrador sem nome, por acaso, é aquele tipo que faz questão de ser útil, de se provar, de ser o parceiro perfeito… mesmo quando isso significa participar de um plano de assassinato que, em retrospecto, deveria ter sido um sinalzinho de alerta. No mínimo, terapia de casal.
Millicent, por outro lado, é aquele tipo de personagem que te fascina e te apavora em igual medida. Manipuladora? Sim. Inteligente? Muito. Capaz de absolutamente qualquer coisa? Com certeza. E ainda assim, por algum motivo inexplicável, você insiste em acreditar que talvez… só talvez… ela não seja totalmente culpada. A autora brinca com essa expectativa até a última gota.
O grande charme da narrativa é a dinâmica entre os dois. O marido vive preso entre a devoção e a ingenuidade, oscilando entre querer agradar Millicent e a consciência tardia de que talvez tenha se casado com alguém um pouco mais… letal do que ele imaginava.
A tensão cresce a cada capítulo, especialmente quando entendemos que Millicent não está apenas “brincando” com a ideia de matar, ela tem método, controle, precisão cirúrgica. E o narrador, bem… está simplesmente tentando não desmoronar enquanto limpa os rastros dela.
Essa relação, essa simetria torta entre os dois, é o que dá ao livro seu coração macabro. Você não gosta deles, mas não consegue desgrudar.
O suspense
A escrita de Samantha Downing é rápida, afiada, cheia de diálogos que, mesmo leves, carregam veneno. O livro te empurra para frente sem que você perceba, e quando nota já está emocionalmente envolvida demais para virar as costas para essa família.
Há twists e mais twists, e mesmo quando você acha que está no controle Millicent ainda está três passos à sua frente. O encerramento então… deixa aquele gostinho de “não pode acabar assim”, mas no bom sentido, aquele tipo de indignação divertida que só thrillers realmente bons provocam.
Além da trama, o livro dá tapas educados sobre:
- confiança excessiva dentro de relações
- como casais constroem segredos em conjunto
- o impacto do crime na rotina doméstica
- ciclos familiares que se repetem, mesmo quando tentamos evitar
Tudo isso costurado com humor, ironia e uma dose generosa de insanidade controlada.
É aquele livro perfeito para quem gosta de thrillers ácidos, dinâmica de casal problemática e histórias que escalam rápido para o desastre, mas sempre com elegância!
Se você quer algo rápido, viciante e cheio de momentos “não acredito que isso está acontecendo”, coloque Minha Adorável Esposa na sua lista. Ou pule a lista e leia agora. Millicent certamente aprovaria decisões impulsivas.