Abri o streaming e coloquei Kill Bill Vol. 1. E foi como tomar um soco no peito — no melhor sentido possível.
Quando terminei Ballerina, novo spin-off do universo John Wick, saí do cinema com uma mistura de encantamento e frustração. A estética é linda, Ana de Armas está brilhante, a narrativa é competente. Mas alguma coisa ficou faltando. Um peso. Um risco. Uma fúria mais crua.
No dia seguinte, por impulso, assisti Kill Bill e depois de Ballerina é quase como reencontrar a mãe do movimento. A origem da raiva coreografada, da mulher armada com sangue nos olhos e propósito no corpo.
Ballerina tenta coreografar dor. Kill Bill a deixa sangrar.
Nos primeiros minutos de Ballerina, já entendemos que há luto, vingança, cicatrizes. A personagem de Ana de Armas carrega o trauma com elegância, os passos de balé entrecortando as sequências de tiro.
É lindo. Mas é contido.

Já Kill Bill nunca se conteve. A Noiva, de Uma Thurman, não dança: ela rasga. Cada golpe, cada expressão de fúria, cada cena de sangue é expressão pura de uma dor que não precisa ser explicada — só sentida.
Enquanto Ballerina ainda se prende às regras do universo John Wick — feito por homens, sobre homens — Já nosso outro protagonista rompe com qualquer tentativa de moldar o feminino dentro do aceitável. A Noiva é intensa, suja, desmedida. E isso é libertador.
As raízes de Ballerina estão plantadas em Kill Bill
O que Ballerina tem de mais valioso — uma protagonista letal, estilizada, guiada por uma narrativa de vingança pessoal — já foi feito há mais de 20 anos. Mas Tarantino fez com mais ousadia.
A trilha sonora exagerada, a violência estilizada, os flashbacks em anime, as coreografias impossíveis: tudo isso moldou o caminho que agora o cinema de ação percorre com mais cuidado — e menos ousadia.
Ballerina é uma flor que brota do solo que Kill Bill regou com sangue.
O feminino no cinema de ação: um duelo entre contenção e explosão
Ballerina tenta encontrar um espaço para o feminino em um universo onde a violência tem regras, contratos e etiquetas douradas. Já nossa obra de Tarantino entrega uma vingança que não precisa se justificar.
Essa diferença é mais do que estética: é política.
Em Kill Bill, Beatrix Kiddo não precisa parecer forte. Ela simplesmente é. E a câmera nunca pede desculpas por isso. Em Ballerina, ainda sentimos a necessidade de equilibrar brutalidade com delicadeza — como se uma mulher com uma arma na mão precisasse provar que ainda é suave.
Kill Bill em 2025? Sim!
Se você gostou de Ballerina, deve a si mesma a experiência de ver (ou rever) Kill Bill. Não como comparação, mas como origem. Ver Kill Bill hoje é como revisitar um grito primitivo que o cinema mainstream tentou domar nos últimos anos.

E a verdade é: a gente precisa desse grito de novo.